Empresas de construção notificadas: Pagar mais IVA!

De acordo com a Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APII), várias empresas de construção civil foram notificadas com liquidações adicionais de IVA para pagar. Em causa, estão obras de reabilitação urbana executadas há vários anos, em que as Finanças alegam que há cobrança de IVA em falta devido à aplicação da taxa errada.

Cobranças inesperadas: A confusão da reabilitação urbana

Esta situação está a causar instabilidade nas empresas que, repentinamente, se veem a braços com valores avultados de IVA para pagar, relativamente a obras que já terminaram, ou seja, em que já não conseguem repercutir os valores nos clientes. Assim, é relevante analisar por que razão está a acontecer esta situação e como as empresas podem reagir.

O regime antes do Programa Mais Habitação

Antes da entrada em vigor do Programa Mais Habitação em outubro de 2023, para as Finanças, o regime de IVA aplicável à reabilitação urbana consistia na necessidade de cumprir 2 requisitos cumulativos para poder aplicar a taxa reduzida de IVA: A empreitada tinha de se situar numa Área de Reabilitação Urbana (ARU) e a obra tinha de ter sido aprovada pelo município como Operação de Reabilitação Urbana (ORU).

Contribuintes começaram a ganhar em tribunal

Porém, devido aos atrasos nos municípios e outros entraves, houve muitos contribuintes que não conseguiam obter o enquadramento numa ORU. Por esse motivo, alguns deles foram para tribunal alegar que bastava que a obra se situasse numa ARU para terem direito à taxa reduzida de IVA. Ora, os contribuintes começaram a ganhar processos em tribunal nesse sentido. Contudo, as sentenças variaram conforme as situações, umas a favor dos contribuintes, mas outras a favor das Finanças.

O novo regime do Programa Mais Habitação

Por esse motivo, para pôr ordem nesta questão, o Programa Mais Habitação (PMH) estabeleceu de uma vez por todas que para aplicar a taxa reduzida de IVA na reabilitação urbana apenas é necessário que a empreitada se situe numa ARU, não sendo necessário estar enquadrado numa ORU. Assim, em outubro de 2023, havia 2 enquadramentos:

  • Obras até 6/10/2023 = Necessidade de ser numa ARU + aprovação do ORU;
  • Depois de 7/10/2023 = Apenas necessidade de ser numa ARU.

Arbitragem Tributária anulou ORU aos casos antigos

Poder-se-ia pensar que a história terminava aqui, mas não. Conforme analisámos na Revista Gerente (ano 17, nº4, pág. 7), houve contribuintes que continuaram a ir para tribunal, relativamente a obras realizadas até 6/10/2023. Nesse caso que analisámos, a Arbitragem Tributária deu razão ao contribuinte, considerando que se podia aplicar a taxa reduzida de IVA, mesmo sendo uma empreitada anterior ao Programa Mais Habitação e sem que houvesse ORU.

STA em 2025 considerou que bastava ARU, mas…

Mais recentemente, o Supremo Tribunal Administrativo (Proc. 00843/23.7BEPRT) também deu razão ao contribuinte, pelo que os empresários ficaram descansados. Na prática, segundo esse acórdão do STA, para aplicar a taxa reduzida, bastava que a obra se situasse numa ARU para beneficiar da taxa reduzida de IVA, mesmo que fosse uma obra realizada antes de 6/10/2023.

E logo depois o STA considerou o oposto!

Depois, houve uma surpresa completa. O mesmo Supremo Tribunal Administrativo decidiu a favor das Finanças, voltando a considerar que era necessário haver ARU e ORU em simultâneo. Ora, conforme noticiamos em abril deste ano, tratou-se de um acórdão de fixação de jurisprudência, ou seja, de um momento para o outro, as Finanças passaram a poder cobrar o IVA (a diferença entre a taxa normal e a taxa reduzida) a todas as empresas retroativamente.

É possível reagir? Há juristas que dizem que sim

Em face desta situação, poder-se-ia pensar que as empresas nada podem fazer que não seja pagar o IVA. Contudo, surgiram vários juristas que defendem que as empresas devem levar o caso ao Tribunal Constitucional, apoiando-se no referido acórdão do STA que deu razão ao contribuinte. Em suma, estamos perante uma das maiores confusões fiscais dos últimos anos em que se sucedem orientações e decisões contraditórias até do mesmo tribunal, deixando as empresas sem saber o que fazer e agora com uma elevada conta de IVA para pagar.

E o novo regime do IVA a 6% para todas as obras?

De acordo com declarações do Ministro das Infraestruturas e Habitação e Miguel Pinto Luz, a redução do IVA para a taxa reduzida para a construção nova e reabilitação que consta do programa Construir Portugal só irá entrar em vigor em março de 2026 e terá as já anunciadas limitações em termos de valor de venda do imóvel ou da renda.